segunda-feira, 20 de junho de 2011

Mulher de peito


     Estatura baixa, cabelos longos, riso fácil. Pela descrição, uma menina normal, provável de se ver em uma loja, no shopping, ou sentada em uma mesa de bar. É boa de conversa até. Gargalha e não teme os vexames que dá entre um mal entendido ou outro. Desenvolveu repentinamente, talvez pela ajuda da dança. Teve os músculos enrijecidos e trabalhados pelo ballet, rotulado coisa de menininha, mas era mais do que sua vontade ver qualquer um que paga de machão ter força para sustentar uma perna no ar sem perder a respiração correta, lembrar de estender os joelhos e para finalizar, sorrir e fazer o movimento parecer leve, prazeroso. É... só quem pratica sabe do esforço invisível por fora, e torturante por dentro que é exigido entre um plié ou um tendue.
     Não se acanha em exibir os músculos que tanto gosta e usa sim saias e shorts que mostrem as pernas saradas – resultado positivo do esforço que era semanal. Até aí, tudo bem, mas se junto da saia, casa com ela uma blusa de alcinha... Pronto, o caos se inicia. E tudo isso por um mínimo detalhe que ela sequer tem culpa. Não escolheu, nem ao menos optou no tamanho de seu problema, que na verdade, parece incomodar mais os outros do que a própria dona: peitos! Os genes que vieram do pai e da mãe se encarregaram de trazê-la tantos comentários, que às vezes de tão desnecessários, teriam de ser relevados para evitar qualquer tipo de constrangimento, complexo ou incômodo.
     “Deve ser biscate.” “Não se valoriza.” “No mínimo a família não dá o exemplo.” “Uma maçaneta com certeza é mais limpa do que a boca dela.” “Tem cara de quem pega e logo em seguida descarta.” “Não se dá o respeito.” “Não anda com boa gente.” Sim, meus caros, tudo isso sai da boca de quem precocemente julga alguém que nem conhece e tenta dar a ficha completa do “produto” atirando em sua direção dos pés à cabeça, sem deixar de dar prioridade a qualquer característica que possa fazer repercutir os pensamentos maliciosos.
     A indignação da menina era imediata. Como poderiam fazer um completo raio-x da moça baseando-se em reflexos do crescimento – que é natural em todos – ? Isso significa que antes da puberdade, ela até serviria para coisas úteis, quiçá pudesse ser uma garota prodígio, seja nas artes, no esporte ou nos estudos, mas depois que cresceu e tomou formas, é vista como uma espécie de catálogo de maus exemplos? De fato, o pré-conceito humano chega a ser lamentável.
     Ainda que fosse só através da boca de pessoas desprezíveis que ela fosse alvejada por tanta baixaria, nem tudo estava perdido, porém, tal calamidade prolifera na mente de pessoas que a conhecem por um ou dois encontros casuais e fazem uma imagem totalmente denegrida do que poderia ser provado o contrário, provocando um estrago ainda maior: a aproximação interesseira de algumas pessoas – sempre do sexo oposto.
     Eles sempre vêm com segundas intenções. Na noite que poderiam suceder, no corpo que estaria à suas disposições, no sutiã que desabotoariam com tanta selvageria e, se esquecem que por trás de toda aquela capa revestida de rendas ou algodão, há uma cabeça que pensa e um coração que sente. Há alguém que não é biscate! Que se valoriza, sim! Que tem uma família exemplar, com toda certeza e certamente é mais limpa do que qualquer porta. Se ela pegou e descartou, acredito que teve seus motivos, e conseqüentemente, se valorizou, afinal, que se levante e atire a primeira pedra o homem que nunca pecou com uma mulher e, por fim, declara que anda sim com boa gente e que talvez foram essas que fizeram com que a abençoada na comissão de frente passasse a enxergar seu corpo como um presente e não como um castigo. Até porque, como é bom poder diversificar os mais variados modelos – que são inúmeros –, cada um para a ocasião que se tem em mente, indo do cor de rosa com babadinhos e bolinhas brancas estampando a menina que habita o corpo de cada mulher àquele vermelho-vinho, de renda, que exala sensualidade. Como é bom poder preencher um sutiã que dê o encaixe perfeito no corpo e sem dúvidas faz qualquer mulher se sentir mais dona de si, poderosa e desejada, mas não por um bando de trogloditas que só sabem pensar com a cabeça inferior, e sim por poucos, que por elas serão escolhidos á dedos e se um dia merecedores, serão donos de uma felicidade indescritível oriunda de uma mulher de peito, e não só de seios, desconhecida do olhar vago e egoísta de simples seres animalescos que por muitas vezes jogaram no lixo o que poderiam ter ganhado de mais valioso, e que estava escondido para que apenas o mais digno encontrasse, mas que a carne - como barreira - impossibilitou os outros de vê-lo: seu coração!

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Amar X Desejar


     Já não bastasse os inúmeros empecilhos com os quais convivo diariamente para me manter estática frente às infindáveis recordações que tenho em mente sobre meu primeiro grande amor, assisto a chegada de outro guerrilheiro na pacatez em que minha vida se encontra e vejo que o conflito será duradouro.
     De um lado, aquilo que eu construí de mais belo e maduro. Meu eterno exemplo de determinação, boas condutas e merecedor da minha plena admiração nos mais diversos aspectos. Mesmo que conhecido de longas datas, foi inesperadamente que passou a ter tamanha relevância em tudo o que hoje julgo necessário em meu cotidiano e ao anoitecer, em meu subconsciente, sempre que protagoniza meus sonhos, me fazendo amá-lo a cada dia com mais fervor. Do outro, alguém comparável a um furacão ou algum outro fenômeno natural equivalente, notado em qualquer esquina que venha a cruzar devido à sua beleza não menos que exuberante. Deste, mal pude conhecer os (bons) valores. Por falta de tempo ou interesse, o que ficou foi a pressa da carne em mostrar quem liderava aquele jogo. Sem mais delongas, apenas prazer. A conversa?! Ah, esta fica para depois, em um próximo encontro que quando chega, é tomado por pura luxúria e deixa qualquer mísero diálogo para segundo plano mais uma vez, e eu ainda assim o desejo, mesmo consciente do meu pecado, desejo! Estou entre os gladiadores que mal sabem de suas inegáveis participações em mim. Permaneço de mãos atadas sem saber para que lado partir, apenas acompanhando a maré que meu corpo e meu coração por hora ordenam.
     Tal diferença de sentimentos que eles me despertam me indaga. É possível que alguém ame uma pessoa e sinta um desejo arrebatador por outra? Estaria eu traindo o sentimento por quem tenho tanta fidelidade? Ou então abusando de alguém toda vez que quero sua pele e suas formas? A partir da minha constante reflexão, sou tomada pela culpa, pela dúvida e pelas incertezas que só aumentam minha aflição diante da falta de uma resposta exata para este tipo de distúrbio emocional.
     Quanto à armadura, ambos desfrutam de igual proteção. O sorriso paradoxal que me busca do céu e me leva ao inferno é neutralizado por um novo olhar, fixo e fuzilador. Os cabelos quase loiros se contrastam com o outro que é preto. A barba que às vezes é falha em X, mostra-se com total freqüência em Y. O corpo de músculos desenhados e curvas atraentes duela com uma cabeça surpreendentemente sábia. O estilo alternativo de um em contrapartida com o conservadorismo do outro. E mais uma vez eu, entre amar e desejar.
     Um minuto a mais pensando na pergunta que desencadeou todo esse transtorno e a resposta vem à tona: Não! Não estou errada! Não vou ser guilhotinada em praça pública porque me vi maior do que sobras de carinho aliadas em pena! Não mereço viver a vida de quem já se completou amorosamente! Não devo satisfações a quem me procura quando já não vê mais nada conveniente a si próprio às cinco da manhã! Não sou culpada por apenas querer o corpo de quem faz o mesmo comigo! Não tenho que viver como se estivesse segurando uma senha, aguardando que chamassem pelo meu nome! E por fim, não! Não estou revoltada, apenas desacreditada; das possibilidades, das oportunidades e também das pessoas e de suas (boas) intenções.
     Ainda que caindo como um bebê que aprende a trocar os passos, vou dando minha cara à tapa e descobrindo o mundo e os seres que me cercam; e quem se encarregou de fincar essa desconfiança em mim, foram os próprios inquilinos que hoje são meus credores – morais e emocionais. Eu, que quase sempre tenho a inocência de acreditar na palavra das pessoas, venho acordando forçadamente de dois sonhos lindos que por falta de reciprocidade deixaram de acontecer. Em uma das circunstâncias, não pude mostrar o quanto é rico o que possuo e como poderia retribuir todos os aprendizados que me foram oferecidos. Já na outra, ainda há a possibilidade de eu encontrar algo que perdure mesmo não sabendo quais os prós e contras dessa aventura. O que me resta é abstrair qualquer tipo de esperança que se faz valer em mim para que então eu deixe de viver sozinha o que sempre me vendem em conjunto – de amores, idealizações e no mais tardar desilusões.

domingo, 12 de junho de 2011

(Re)conhecendo-o


     Profissional na arte da lábia e da boa conquista, ele começa a preparar seu território outra vez depois de ter recuado repentinamente. É indispensável fazer o jogo do bom moço; elogiar e dizer que sente saudades para que passe longe dos meus pensamentos embaraçados que qualquer tipo de atitude digna de um cafajeste nato possa vir de sua parte. Dito e feito!
     Eu logo de cara acreditei em uma maturidade de afetos que me foi vendida. No pacote promocional, um jogo de belas palavras e aparentes boas intenções pelo preço da minha talvez impagável paz de espírito e do bem estar do meu ego. Tarde demais! O produto era pirata, e nota de garantia eu não tinha. Saldo final: uma dívida não paga, sozinha.
     Ainda assim eu não me proibi. Mesmo que com a cabeça mais centrada do que no princípio, atendi às chamadas durante a madrugada e deixei que ele me puxasse de volta para seu redor.
     O celular toca enquanto o dia amanhece lá fora. Em uma hora tão improvável, e sem nenhuma esperança de sua presença, fico surpresa ao saber que a noite ainda não tenha acabado. Espero então, de maneira ansiosa para ter em mãos aquele homem que me faz perder as palavras quando tento defini-lo. Talvez ele nem seja merecedor desse pedestal que venho construindo a cada novo encontro, já que insiste em fazer do que poderia ser belo, nada mais do que superficial, entretanto seu poder de atração me vence e eu o recompenso como posso.
     Quando ele chega, meus passos – trêmulos e apressados – se aproximam gradativamente daquilo que para mim é o paraíso, o ápice da boa sorte. Ao entrar no carro, um beijo breve saúda minha boca e então uma sensação de ternura toma conta de mim. O perigo acena em minha direção, insinuando que qualquer excesso afetuoso pode devastar este motor pelo qual estou ali: meu coração; porém, a esta altura só tenho olhos para a sedução que é atirada em mim com tanta intensidade.
     Ao mesmo tempo em que dirige, me pergunta como estou e com quem eu estava, me fazendo acreditar que ele até possa se preocupar comigo, e eu, estonteada por sua voz grave, abdico de qualquer resquício racional para me entregar de vez à tentação.
     Paro e admiro incansavelmente essa espécie de escultura-natural-humana que se põe em minha frente. Cada minúcia é única e me satisfaz inteiramente mesmo que sem nenhuma razão... apenas me agrada. A corrente prata envolta no pescoço, a autenticidade nas roupas que veste, e até o poder de persuasão – quando me faz ouvir músicas que por anos condenei e dizia não gostar – mesmo que sem o seu conhecimento sobre tal. E depois me dilacera por ser assim, pássaro, águia que enxerga longe, além dos limites da cidade e é livre de qualquer outro ser local que queira sua presença, tem seu próprio caminho e nele anda como bem entende, enquanto eu, presa na minha menoridade tento me confortar com as vezes em que ele aparece sem aviso prévio já sabendo que estou pronta para recebê-lo sem questionar sua ausência que é sempre presente, sem ter a preocupação de ouvir cobranças que mesmo necessárias me falta coragem para fazer, sem qualquer compromisso em ter que ligar no dia seguinte para ouvir como eu estou e o que tenho pensado em relação a nós – plural que talvez seja inexistente em sua cabeça tão egocêntrica.
     Por todas as razões claras que tem me mostrado e que eu ingenuamente fazia questão de não acreditar, presumo hoje que o príncipe encantado não exista, quiçá existiu. Anda em um sentido contrário ao que me mostrou quando em sua primeira tentativa de me ter não hesitou em exibir, vangloriando-se de sua conduta em relação a relacionamentos e me convencendo de que tudo o que passei, o bom samaritano estaria disposto a me dar de maneira diferente e correta. Caiu em contradição e perdeu-se em suas próprias palavras, ou então, perdi-me em suas mentiras gritantes onde transborda apenas interesse. Não sei, e jamais saberei o que realmente aconteceu, mas como diria Caio, “Que seja doce!” e assim foi!

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Isa, a bela


     Dezessete anos, e entre eles, me encontro em cinco. Matematicamente, 30% de uma vida repleta de luz. A porcentagem aparentemente é pequena, porém a intensidade com que foi vivida, excede o total, o inteiro.
     A princípio, apenas a superficialidade era de se destacar. O convívio era diário, entediado por cinco aulas, então nada mais a se esperar além de alguns diálogos ainda acanhados, devido à falta de intimidade. O episódio da novela do dia anterior, a cor do esmalte da menina da outra classe, o que achamos do clipe daquela banda que não parava de tocar, o resultado dos testes de amor da revista adolescente ou então como era lindo o mocinho da nova temporada da Malhação.
     Daí a alguns meses, os laços ganharam maior resistência. Ainda me lembro da primeira vez em que deixamos de lado o trajeto casa – escola e então combinamos a primeira saída com as amigas em comum. Por algum motivo, todas faltaram e ali, apenas eu e ela. Talvez essa tenha sido a chave para desembocar algo que hoje é tão intrínseco.
     As descobertas foram se fazendo nesses anos todos, uma a uma, e a conclusão a que cheguei, é que, de fato, encontrei um tesouro. Pode parecer clichê, ou então fala característica de tia, usar tal objeto para designar o que quero, porém, por ser tão valiosa, desconheço outra relação que possa ser feita, ou ainda, me contradizendo, há tantas comparações cabíveis, que acabo por me perder em meio às inúmeras qualidades e os possíveis discursos.
     Pele clara, quase branca, estilo europeu. Cabelos castanhos, sorriso inocente, olhar e olhos fortes, marcantes, que dão rigidez onde não há indícios sequer da mesma, tamanha meninice que habita seu corpo. Uma borboleta – leve e colorida – em constante metamorfose. E como mudou desde os primeiros momentos em que a conheci. Cresceu, amadureceu. De menina ingênua, com medo da rua e de quem estava nela, desabrochou uma mulher, da qual me orgulho por ter acompanhado a transformação. Ficou velhaca e como eu mesma costumo dizê-la, “o couro foi ficando grosso”. A vida quis assim que ela aprendesse, aos poucos, aos tombos, e levasse cada ferimento das quedas sofridas com muita prioridade, para que não caísse outra vez. Das dezenas de qualidades, a que mais admiro é o valor dado aos seus valores. Não há quem consiga persuadi-la se o assunto em questão não é de sua índole. Postura que invejo, já que por tantas vezes contradigo o que me imponho por pura impulsividade.
     Cúmplices. Assim eu nos definiria atualmente. Quando mais me surpreendi, foi ao ver que em uma dada situação, ela conseguiu perceber meu descontento com o lugar em que estávamos sem que eu ao menos expressasse qualquer incômodo com o ambiente. “E eu não te conheço né, Beatriz?!” Foi o que ouvi quando comentamos sobre tal fato.
     Quando o assunto é amor, se puséssemos em uma balança todas as minhas dores que com ela desabafei, acho que não a faltaria créditos comigo para qualquer assunto escolhido ao acaso simplesmente por ter ouvido minhas infindáveis lamentações, ter me dado conselhos, e na pior das hipóteses, me atender de madrugada para, calada, me ouvir chorar. Realmente, não há preço que pague tal paciência.
     Conversamos, rimos, choramos, nos surpreendemos, odiamos, relembramos, reconhecemos, admiramos, nos indagamos, vivemos. São tantas as recordações que eu não poderia optar por uma ou outra se for para falar de tudo o que vivemos juntas. Ao mesmo tempo em que tento descrever aqui tudo o que me é importante se falo dela, vejo-me em uma dívida grandiosa com as palavras e com os meus sentimentos, pois eles são extremamente maiores do que qualquer junção de letras.
     Hoje, desejo-a uma vida repleta de felicidades, e que eu possa ter sido alguma delas durante essa trajetória que ainda não se findou. Agradeço pelo que recebi, e peço para que nosso caminho se estenda cada vez mais, e que juntas estejamos para somar: sua cabeça com o meu coração, sua delicadeza com a minha extravagância, sua inocência com a minha desconfiança, seu esforço com a minha leveza da vida, daí a achar o termo comum em nós, o amor, e então resultar em algo que por cinco anos deu certo: nossa amizade!

domingo, 5 de junho de 2011

Avassalador



    Um sábado como outro qualquer e, ao anoitecer os preparativos começam.
    Acabo o banho e então a decisão feminina mais conflituosa faz-se presente: “Com que roupa eu vou?” Abro o guarda-roupas que quase faz as roupas saltarem em mim; entretanto, diante dos meus olhos elas parecem brincar de pique–esconde. Já é de praxe o drama da alma feminina: ver-se nua mesmo quando colocadas cara a cara com um verdadeiro mar de tecidos.
    Recebo então a primeira ligação da noite. As amigas dizem que estão chegando. Pronto, o clã está formado! Pega o secador, liga a chapinha, aponta o lápis, testa a sombra, prepara a pele, coloca o salto, borrifa o perfume, confere os documentos, e para finalizar, o personagem principal da noite: o batom... vermelho!
    Acaba a festa, primeira etapa concluída. Noite de mulheres apenas, mas o paradeiro continua. “Para onde vamos?” Bom, seria mesmo só calcinhas até que a lua se pusesse, se não fosse o amigo, um em especial e sem dúvidas, o mais querido de todas, e com ele, o prêmio da noite – o primo – e eu, a premiada.
     Famoso entre as bocas femininas, nome conhecido, corpo cobiçado. Não duvido do possível recalque de alguns barbados até, já que o sucesso do Don Juan acaba por assustá-los vez em quando. Seguramente, afirmo que nove entre dez meninas não o deixaria passar despercebido ao flagrá-lo caminhando pela rua e nem mesmo dentro do carro preto que dirige. Os olhos são castanhos, cor de mel, doce como os beijos com os quais viria a me presentear. A pele dourada, lisa, se tonaliza em completa sintonia com os cabelos baixos e com a barba que nasce de mesma cor e que, de fato, me remetem ao pecado, além de serem um cônjuge perfeito da boca de lábios quentes que arrematam o desejo de tê-lo ao menos uma vez, já que este não faz o tipo que se ajoelha diante de sua musa e pede por amor eterno.
     Surpreendo-me então por perceber, aos poucos, que naquele dia a noite me escolheu e, o Todo Poderoso também. Galanteador da maneira que é, afirma o que diz, é confiante em si. Tem um jeito peculiar que domina qualquer Vênus e não mede as dosagens de seu charme ao jogá-lo sobre suas presas. Ganha no jeito de andar, na postura, nas poses enquanto passa a mão pela nuca, e no olhar devorador com o qual fitava minha boca de lábios escarlates.
     A união perfeita de todos os fatores – internos e externos – conhecidos até então, me puseram boquiaberta pelo príncipe. Há uma música que diz “é exatamente quando a gente está cansado, que o coração distrai e então, a sorte vem”. Vejo-me refletida nesses versos. Não sei se por sorte, ou por merecimento depois de dois longos anos presa em uma armadilha que ajudei a construir, mas o fato era exclusivamente um: ele estava ali, para mim. Em uma série de flertes, olhares intencionados em meio a uma conversa em uma roda de amigos, o gato sorrateiramente me surpreende com um abraço e eu, agora mais do que envolvida na situação, me rendo a alguém que jamais havia me interessado antes. 
     Talvez eu fosse até o momento, a única entre as dez meninas citadas anteriormente andando na contramão, mesmo já tendo sido cortejada pelo mesmo um mês antes, em outra ocasião, na casa onde ele era o anfitrião. Sigo agora no mesmo trajeto de muitas quando não mais me esquivo e então cedo-me. O batom que por ele foi tantas vezes elogiado, em minutos fora exterminado da minha boca com os beijos simbióticos, intensos, e de perfeito encaixe que vieram a seguir e deram um desfecho irrevogável ao episódio aqui descrito.
     Abri-me então para novos caminhos e comecei a enxergar a vida além de um coração partido que esperava incansavelmente por um retorno do que nunca foi inteiro, e sempre um “quase”. Quase amor, quase compromisso, quase sentimento, quase correspondida, QUASE FELIZ. Ponho a venda tudo o que me retrocede. Quero agora a aventura de não saber do amanhã para então conhecer tudo que a vida me reserva. Livre, leve e solta!

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Encanta a dor


     Em mais uma noite, é em frente a um papel que eu me encontro, na tentativa de dividir com alguém essa dor que transborda em meu peito, alma, cabeça, corpo e coração. É, eu sei que essa é uma maneira meio fracassada de resolver tal estrago, já que o único expectador desse drama nem um pouco ficcional é o próprio escritor, enquanto quem deveria ter conhecimento da obra, é o ator principal - o protagonista de uma eloquência de sentimentos.
     Flagro-me pensando em como tudo começou e, hoje, depois de um ano, como tudo mudou; e o que me pergunto é: POR QUÊ? Por mim, talvez. Por não pensar e então em questão de um ou dois minutos ter traçado um roteiro tão contrário ao que estava pré-destinado. Por ele, também. Por que não? Por ter sido egoísta o bastante a ponto de me ter por conveniência. Não me importa o motivo; ele não é maior que meu coração que tem passagem secreta para um sorriso fuzilador, um jeito másculo que extermina qualquer cogitação de resistência física ou emocional quando se une a pensamentos adultos que só deixam crescer e entender o porquê de tanta admiração.
     Sempre me mantive estável diante dos olhos que me envenenam, buscando um querer de quem tanto me consome, sendo este o de saudade - sentimento que faz pensar, refletir, lembrar e então agir, e a partir desta ação, fazer com que ele pudesse querer estar comigo de novo. É esta minha única salvação: a presença de quem me faz tão ausente em si. E por que então desejar quem me despreza? Vem aqui então uma série de piadas para quem desconhece a paixão! Eu o quero pela maneira do andar, pelo olhar de pessoa séria enquanto conversa sobre o futuro e as profissões. Quero a barba por fazer que me deixa arrepiada ao roçar sobre meu corpo, quero a sensibilidade escondida que vejo aflorada quando tem os olhos fechados ao ser acariciado. Quero as mãos tão expressivas, masculinas, quero a maturidade, a infantilidade e a brutalidade que vaza pelos dedos que tocam com tanto domínio cada fio do meu cabelo. Quero o mínimo que se ao meu lado, por ser essencial, se tornará o máximo. Conversa de louco?! Vai entender, não?! Prazer, AMOR!
     Sim, amor! Não há mais espaço para a paixão onde o que há de mais terno tomou posse. Não há mais lugar para sintomas infinitamente instantâneos, cobertos por dizeres amorosos que se desmentem após uma mágoa guardada. Essa fase se foi, esse terremoto psicológico e emocional que é a paixão e, o que ficou foi a calmaria, como a de uma manhã em uma praia deserta que vence uma noite de tempestade, onde o que se vê são as folhas dos coqueiros que se embalam em uma dança ditada pelos ventos, e o calor do sol que volta a brilhar, traz à tona a razão para que tudo permaneça: a luz, que é você!
     Agora sim me sinto no direito de dizer que amo no sentido mais puro da palavra. Amo sem interesse, cobrança. Acredito que amo por aceitar. Aceito quem você é, o que me faz, como me quer. Aceito a vida que nasceu em mim, aceito que porto duas pessoas em um único corpo e, este segundo "eu" que não me pertence, é tão prepotente quanto aquele em que se espelha a ponto de involuntariamente virar-se para onde quer que ele esteja.
Procuro aromas que me remetam a qualquer lugar presente no meu pretérito perfeito, atento os olhos às fotos que não deixo passar sem antes analisar milimetricamente cada detalhe de um rosto que me é tão enigmático, ouço ruídos corporais, notas musicais que me transportam para outros lugares, me fazendo reviver o que a vida já me deu de mais belo. Toco meu travesseiro, acaricio-o na busca desesperadora de substituí-lo por seu peito que ostentava meus cabelos e me fazia adormecer e, saboreio após todos esses sentidos o amargo gosto salgado das lágrimas já que tudo o que conheço de mais sublime é vivido em solidão. Uno então os cinco sentidos de todo ser humano ao sexto nem tão exposto assim; uma mistura que só você me faz sentir e mal sei explicá-la, mas posso, com firmeza, ressaltar o aprendizado que você me ofereceu - o do amor e o da esperança! Grata...