Estatura baixa, cabelos longos, riso fácil. Pela descrição, uma menina normal, provável de se ver em uma loja, no shopping, ou sentada em uma mesa de bar. É boa de conversa até. Gargalha e não teme os vexames que dá entre um mal entendido ou outro. Desenvolveu repentinamente, talvez pela ajuda da dança. Teve os músculos enrijecidos e trabalhados pelo ballet, rotulado coisa de menininha, mas era mais do que sua vontade ver qualquer um que paga de machão ter força para sustentar uma perna no ar sem perder a respiração correta, lembrar de estender os joelhos e para finalizar, sorrir e fazer o movimento parecer leve, prazeroso. É... só quem pratica sabe do esforço invisível por fora, e torturante por dentro que é exigido entre um plié ou um tendue.
Não se acanha em exibir os músculos que tanto gosta e usa sim saias e shorts que mostrem as pernas saradas – resultado positivo do esforço que era semanal. Até aí, tudo bem, mas se junto da saia, casa com ela uma blusa de alcinha... Pronto, o caos se inicia. E tudo isso por um mínimo detalhe que ela sequer tem culpa. Não escolheu, nem ao menos optou no tamanho de seu problema, que na verdade, parece incomodar mais os outros do que a própria dona: peitos! Os genes que vieram do pai e da mãe se encarregaram de trazê-la tantos comentários, que às vezes de tão desnecessários, teriam de ser relevados para evitar qualquer tipo de constrangimento, complexo ou incômodo.
“Deve ser biscate.” “Não se valoriza.” “No mínimo a família não dá o exemplo.” “Uma maçaneta com certeza é mais limpa do que a boca dela.” “Tem cara de quem pega e logo em seguida descarta.” “Não se dá o respeito.” “Não anda com boa gente.” Sim, meus caros, tudo isso sai da boca de quem precocemente julga alguém que nem conhece e tenta dar a ficha completa do “produto” atirando em sua direção dos pés à cabeça, sem deixar de dar prioridade a qualquer característica que possa fazer repercutir os pensamentos maliciosos.
A indignação da menina era imediata. Como poderiam fazer um completo raio-x da moça baseando-se em reflexos do crescimento – que é natural em todos – ? Isso significa que antes da puberdade, ela até serviria para coisas úteis, quiçá pudesse ser uma garota prodígio, seja nas artes, no esporte ou nos estudos, mas depois que cresceu e tomou formas, é vista como uma espécie de catálogo de maus exemplos? De fato, o pré-conceito humano chega a ser lamentável.
Ainda que fosse só através da boca de pessoas desprezíveis que ela fosse alvejada por tanta baixaria, nem tudo estava perdido, porém, tal calamidade prolifera na mente de pessoas que a conhecem por um ou dois encontros casuais e fazem uma imagem totalmente denegrida do que poderia ser provado o contrário, provocando um estrago ainda maior: a aproximação interesseira de algumas pessoas – sempre do sexo oposto.
Eles sempre vêm com segundas intenções. Na noite que poderiam suceder, no corpo que estaria à suas disposições, no sutiã que desabotoariam com tanta selvageria e, se esquecem que por trás de toda aquela capa revestida de rendas ou algodão, há uma cabeça que pensa e um coração que sente. Há alguém que não é biscate! Que se valoriza, sim! Que tem uma família exemplar, com toda certeza e certamente é mais limpa do que qualquer porta. Se ela pegou e descartou, acredito que teve seus motivos, e conseqüentemente, se valorizou, afinal, que se levante e atire a primeira pedra o homem que nunca pecou com uma mulher e, por fim, declara que anda sim com boa gente e que talvez foram essas que fizeram com que a abençoada na comissão de frente passasse a enxergar seu corpo como um presente e não como um castigo. Até porque, como é bom poder diversificar os mais variados modelos – que são inúmeros –, cada um para a ocasião que se tem em mente, indo do cor de rosa com babadinhos e bolinhas brancas estampando a menina que habita o corpo de cada mulher àquele vermelho-vinho, de renda, que exala sensualidade. Como é bom poder preencher um sutiã que dê o encaixe perfeito no corpo e sem dúvidas faz qualquer mulher se sentir mais dona de si, poderosa e desejada, mas não por um bando de trogloditas que só sabem pensar com a cabeça inferior, e sim por poucos, que por elas serão escolhidos á dedos e se um dia merecedores, serão donos de uma felicidade indescritível oriunda de uma mulher de peito, e não só de seios, desconhecida do olhar vago e egoísta de simples seres animalescos que por muitas vezes jogaram no lixo o que poderiam ter ganhado de mais valioso, e que estava escondido para que apenas o mais digno encontrasse, mas que a carne - como barreira - impossibilitou os outros de vê-lo: seu coração!

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