sábado, 29 de outubro de 2011

O sentimento do lado que ficou


     A matemática nunca foi nossa prioridade. Dito isso, esqueçam qualquer tipo de cálculo nas nossas conversas, senão aqueles que contavam os dias para o próximo feriado e tudo mais que precisaríamos para organizá-lo. No canto esquerdo da sala de aula, bem rente á porta (talvez, inconscientemente isso significasse a nossa vontade de logo ir embora dali) era onde tudo se passava. Desde os desabafos mais sérios e aflitos, às besteiras das quais ríamos sem que ninguém além de nós duas pudesse entender tamanha histeria transparecida em gargalhadas.
     Não só ríamos como também chorávamos de tanto fazê-lo. Tanta alegria chegava até a repelir alguns – professores na maioria dos casos – que certamente prefeririam nos ver bem do lado oposto da porta azul que nos tangenciava, ou então a contagiar outros que se embalavam nas nossas risadas de alto e bom tom. Amando-a ou não, o fato é exclusivamente um: ela faz falta, e sei que posso dizer isso com toda propriedade e convicção que me couber.
     A princípio tudo era um acontecimento longínquo, distante da rotina dos dias entediantes até; mas quando menos nos demos conta, tão logo chegou. Acho que só percebi que realmente uma hora não haveria mais como adiar tal partida, quando na virada do ano, nosso abraço foi mais forte e eloqüente do que qualquer outro nesses anos todos em que estivemos juntas, mesmo sem ter dito uma só palavra. Ainda me lembro dos seus olhos transbordando lágrimas, as quais provavelmente exprimiam certo aperto e muitas dúvidas no coração quanto á esse novo desafio posto em sua vida.
     A ousadia que é parte integrante da sua personalidade forte e convicta do que faz e pensa, chega a me surpreender. Prova disso era quando até aos professores conseguia enganar em busca de pontos, reconhecimento ou mérito, mesmo que merecedora honesta dos mesmos ela não fosse. Eu, como o melhor que sei fazer, apenas ria. Por ser assim, sem medo de cara feia – contrariamente a mim que não gosto de estar mal com os outros, ainda que sozinha eu esteja – me mostrou um lado da vida que eu preferia não desenvolver: o de se impor, mostrar-se com razão em todas as discussões que assume liderança, mesmo que lá no fundo soubesse que não era de inteiro sua certeza. Teimosa como poucos, me irrita sempre que tenho certeza do que ponho em jogo, e ela por não ter a mínima vontade de voltar atrás e dar o braço a torcer, insistia em discordar. Eu, que ainda assim tentava convencê-la, quando conseguia, recebia de resposta um riso malandro acompanhado de alguma coisa como “Você só ganhou seu orgulho me mostrando isso.” E então, mais uma vez eu caía no riso embasbacado por tamanha lábia e o famoso jeitinho de saber conduzir tudo e todos.
     Quando digo que meus dias não são mais os mesmos, porque já não choro mais diariamente de tanto rir, não minto; e quem estiver por perto pode confirmar. Nós que nunca quisemos tirar nota dez, ou rabiscar na testa o primeiro lugar de uma vaga na faculdade, vivemos intensamente três anos de pura adrenalina, a qual caminhava de mãos dadas ao ócio de um lado, e à preguiça do outro. “Tem prova sexta-feira? Na quinta a gente vê o que cai, então.” Se as redações eram cobradas, as respostas eram logo dadas “Mas eu já mandei no seu e-mail, Tatiana”. E assim vivíamos em oito aulas diárias, talvez necessárias sim, mas nenhuma fórmula que nelas foram passadas superava os outros valores que, de fato, nos faziam caminhar.
     A minha disposição e dedicação dentro da sala de aula, que nunca foi meu ambiente preferido nem quando juntas estávamos, agora já é praticamente invisível, porque sei que assim que eu me sentar às sete da manhã na mesma cadeira azul, não terei para quem colocar o meu fichário sobre a do lado e guardar um lugar para ela que quando chega, tão cedo reclama de ter que estar ali, mais uma vez. E também porque agora os fones de ouvido que em pensamento nos transportavam a outros lugares, são só meus, os dois. Sem contar ainda, da temida e também confidencial agendinha que marcava não só o quanto precisaríamos acertar nas próximas provas, mas também a lista e os demais cuidados necessários das vezes em que íamos ao rancho.
     As lembranças são as melhores possíveis, e a saudade, a de maior tamanho. É provisório, eu sei. E que ela vai voltar, é óbvio. Mas enquanto isso, os dias passam sim menos risonhos, porque até das implicâncias eu sinto falta: com o meu anel de golfinho, o meu brinco de “paz e amor”, e a minha impaciência para com os relacionamentos demasiadamente fixos – assunto que sempre nos fazia discordar. Um ano passa rápido, e bem sabemos disso, porque jamais imaginávamos que o terceiro e também último fosse tão rápido a nossa realidade. Desejo então, que ela logo venha, porque com um abraço caloroso, eu a espero!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

O que há entre o amor e a esperança


     Eu sei lá o que é que você botou em mim; se foi veneno nos meus olhos ou uma mordaça na minha boca ou um sossega-leão dentro do meu coração. Seja lá o que for, quero te dar meus sinceros parabéns por ter sido tão capaz de domar qualquer fração minha sem que fosse necessário da sua parte se preocupar com a mínima resistência do outro lado do campo da batalha: o meu. E funcionou. Sua tática que sempre vi como uma incógnita funcionou de tal maneira que às vezes chega a me irritar por conseguir fazer com que eu seja tão mais você do que eu mesma, quase á todo momento.
     Você me cansa, sabe. Sua contradição me enlouquece. Se me falasse de uma vez o que é que se passa nessa sua cabeça tão paradoxal, que sabe ser tão homem maduro quanto às decisões tomadas e tão moleque inconseqüente quanto às atitudes oferecidas, tudo se resolveria. Tão contraditório, busca em mim alguns momentos para fugir da sua – escolhida – realidade? É isso? Por acaso meu nome está aí em uma agenda qualquer largada em cima do seu criado que, mudo, consente tanto egoísmo e que você pega só quando quer dar uma aliviada na tensão dos dias? Acertei agora? Ou então, ainda te resta alguma coisa que eu deixei e que você se nega a aceitar por um motivo que nenhum de nós sabe? Desejo? Prazer? Ou vontade de me provocar para que eu aja e te favoreça, tomando o lugar da louca impulsiva que todos conhecem, enquanto você continua na zona de conforto que sempre foi seu trono, evitando qualquer tipo de culpa que certamente te deveria ser atribuída também? É isso o que mais me convence.
     Pois é, dúvidas são os únicos presentes que hoje você me dá, e são daquelas que chegam a confundir e se alastrar ainda mais no peito que já não tem mais para onde se expandir porque você tomou conta do todo. Tudo se discorda, e eu comigo mesma, principalmente. Se antes estava certa do que fazer, agora titubeio por me faltar coragem de por em prática meu egocentrismo porque deixo que mais uma vez entre em campo seu time muito bem estruturado: altura compatível á minha pequenez, sorriso largo e anestésico às minhas dores, mãos compridas e de total segurança.
     É de natureza – ou melhor, da astrologia – essa minha eterna indecisão: vermelho ou preto, saia ou shorts, salto alto ou rasteirinha. Te esperar ou de uma vez por todas te abandonar? Permaneço nessa instabilidade esperando que alguma luz apareça exclusivamente para me tirar dessa monotonia de você, mas tá difícil, tá difícil. Sábio que foi, Fernando Pessoa disse uma vez que “tudo o que chega, chega sempre por alguma razão” e sabe que é bem verdade? Junto de você, que quando veio causou um reboliço em uma vida que era toda programada, vi se aproximar, aos poucos, a falta: de mim. E ela deve ter seus motivos para me fazer aceitá-la tão assídua, e eu sei que realmente tem. Mas esse brinquedinho aqui dentro que adora – de segundos em segundos – dar suas batidas para que eu me lembre de quem manda mesmo no pedaço, faz questão de ir contra todas as morais e os bons costumes, os quais eu deveria tratar com extrema prioridade. E o resultado disso tudo você já conhece: eu por aqui; em meio às letras, às analogias, às vírgulas e aos tão esperados pontos finais que são sempre prolongados e metamorfoseiam-se em reticências.
     Talvez nossos destinos estejam mesmo apontados para lados opostos. Você com a razão e eu com a emoção, você pensando no futuro e eu vivendo o agora, eu querendo o próximo e você a distância que hoje se resume em basicamente nós. E talvez essa distância me sirva como um antídoto para a loucura que criei, e me faça colocar nos eixos todas as estruturas que de mim você roubou. Porque talvez o conto de fadas que me vi construindo em um tempo de pura idealização, tenha ido embora ao passo que viu chegar o bom senso e as ameaças da realidade. Virei doença, virei vício, quiçá engano. Alguma coisa que hoje, vencida pelo cansaço, me impossibilita de seguir navegando rumo á terra que a cada dia penso menos conhecer, é o que me estimula a partir em busca de novos trajetos. E se essa for mesmo a rota que a mim foi prescrita, que eu a aceite e não mais questione, pois mesmo que tudo pareça correr em sentidos contrários, vale lembrar que se os opostos, de fato se atraem, os caminhos traçados seguirão a mesma regra e, nessa esfera de água, terra, pessoas e tantas turbulências em que vivemos, pela lógica, um dia tudo há de se encontrar e de cara!

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Quando se quer mudança


     Fico pensando nesses capítulos do livro ainda inacabado que é minha vida. Tanta coisa inesperada, jamais imaginada antes. De tudo um pouco. Teve surpresa, teve dor, teve riso, teve lágrima, aventura, desespero, paixão e despaixão, dúvida e a presença – que já pensei ser ilustre – do amor.
     Pode parecer um comentário pessimista, mas essa observação dada ao último sentimento ai em cima que por todos é visto como algo tão esplêndido, não tem minha inteira crença. Quando se dá a cara á tapa e se recebe a bofetada, não bastando em um, mas dos dois lados da face – já que costumeiramente o amor próprio não é ativado ao se enganar pela primeira vez – dá para perceber que nem tudo caminha como deveria.
     Ao meu ver, em primeiro lugar o amor deve ser recíproco. Vejo então o ponta pé inicial para um futuro desastre, já que desconheço outro que se encaixe nessas particularidades senão aquele amor de pai e mãe. A gente conhece, conversa, se envolve, beija, abraça, se abre e ai um mundo novo nasce. E o pior: quando tudo isso é unilateral. Só um sente, só um cede, só um se entrega, e no bom e claro português que bem conhecemos, só um se fode.
     Não digo por aqueles que encontram os amores de suas vidas e namoram, e se casam, e têm filhos, e netos e uma vida cheia daquelas rotinas apaixonadas que até hoje só vi em propagandas da televisão. Falo apenas por mim, que até hoje desacredito desse tipo de convívio assim, tão ideal.
     Não é que ele não exista, apenas não chegou até mim. Não é que ele tenha se perdido no meio do caminho, apenas não é hora de se apresentar. Não é que ele não virá, está apenas esperando o momento certo de eu entendê-lo. Não é que eu não o mereça, apenas não saberia lidar nesse momento. Não é que não terei, por hora apenas não o conheço. E é melhor assim.
     Dizem que o tempo sabe a melhor hora de por cada peça em seu devido lugar. Acredito e não tenho pressa, mas a hospitalidade para receber e comprovar a imensidão dessas quatro letrinhas bate á minha porta sempre que ares de renovação afetiva aparecem. É fato e talvez errado, pois assim se espera demais daqueles que provavelmente não têm muito a oferecer.
     Por mais uma vez, posso estar defendendo meu ponto de vista válido até o fim do dia ou da semana, tamanha inconstância que vivo, mas, passo a passo a mente vai descansando, as idéias clareando e o coração se abrindo novamente à vida, porque talvez, tanta devoção tenha sido em vão e ainda que eu tenha me convencido do contrário por tantos meses, acho que já tive provas suficientes de que sou mais do que me deixei ser. Abro os olhos e encho de ar os pulmões que me dão vida para respirar e continuar a trilha que me foi reservada. E se for para olhar para trás e rever o que ficou, que seja apenas para não mais repetir o erro que me prendeu a simplesmente nada!

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A companhia do inconsciente


     Me pego com um sorriso dando graça ao rosto e com os olhos brilhantes quando percebo meus pensamentos: você; e nossas conversas com nenhum ar de seriedade, compromisso, que dirá satisfação. A vida era leve, criança; fechava o riso apenas para por em prática a responsabilidade – restrita a nós – que vez ou outra aparecia e tinha nossa inteira aceitação. Era contrária a essa relação tão pesarosa que hoje (sequer) nos mantêm.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Tudo novo. De novo


     É bom, e como é. Só assim eu sei definir isso que pula radiante aqui dentro, pois não há palavras que expliquem o porquê de tanta satisfação. Pega de surpresa como fui, melhor ainda. Ver que restam pedaços de alguma coisa boa que passou, mesmo que com um tamanho quase invisível, é o que revitaliza algum tipo de crença no futuro, alimenta a alma, revigora a pele e abre de volta o sorriso sincero a estampar o rosto.
     Junto da primavera que há pouco chegou, floresce nessa estação a maior variedade de pétalas e cores que agora me representam. A paz – do espírito e da mente – por convenção vejo branca e a tranqüilidade recém chegada, traz consigo o azul que acalma. A alegria recebida é laranja, viva e calorosa, e o vermelho fica com todas as outras sensações sabidas por todos que passam por mim e reparam em meus olhos que distribuem brilho a quem quiser enxergar.
     Tem sido assim nesses últimos dias e rogo para que permaneça por um tempo indeterminado. Aos poucos, que é para não cansar, tampouco enjoar. Contendo a ansiedade, vou nessa de controlar meus próprios pensamentos para não me perder mais uma vez em um labirinto já conhecido de nome e vivência. E é difícil, pois quando se tem o menor conhecimento que seja, daquilo que se passa do outro lado, aumenta a sede de querer saber sempre mais: o que foi do final de semana e o que será da próxima já exaustiva devido a época do ano, o que tem pensado sobre os assuntos que são rotina nas bocas alheias, e sobre aqueles nem tão expostos assim, os quais verdadeiramente me interessam.
     Se me lembro do princípio, hoje vejo que progredi. Espero que não apenas devido à distância, mas também pela ajuda do reconhecimento e da aceitação que tiveram de descer a seco pela garganta que tantas vezes gritou por um único motivo. É da minha natureza esse jeito meio perdido de ser quando o assunto em questão tem tanta relevância, tal qual o que me refiro. Acertar e agradar são os únicos verbos que passam a existir em meus atos que, nesse tormento louco de querer sempre o melhor, se perdem e acabam tropeçando na correria que busca presentear alguém com a tão sonhada perfeição, mesmo sabendo que independente do esforço ou dedicação para com aquilo ou aquele que mais quero, ela em tempo algum existiu e nem está por vir.
     Vontades a parte, o importante é ter outra vez esse estado de bandeira branca erguida, trégua declarada. Vale reconhecer que por mais desajeitado que seja um aparente recomeço depois de um caminho turbulento e traumático, ele está de volta, e merece ser recebido e celebrado com brinde em taças de champagne, como bem fazemos na virada de todos os anos, que é para mais uma vez encher o coração de esperança, reabastecendo esse motor que pela estrada percorrida, nunca teve destino certo: a vida.
     E por falar em vida, ela ensina sim, e cobra o aprendizado das lições dadas também. Prova disso é a resistência exigida contra tudo o que menos se quer abster: o tato, a entrega; porque é preciso colocar em prática a outra face dessa grandiosidade sentida, se a vontade agora é de ser vista com outros olhos e outros valores. Tudo começa a partir daí, hoje eu sei. Sendo assim, uma porção de amor próprio e uma dose de respeito, por favor. E para acompanhar, trevos de quatro folhas, água benta, simpatias e o que mais puder fazer a sorte se sentir acolhida e motivada a lutar pela minha causa. Confio, e por isso espero no mesmo ritmo de sempre. Calma, calma!

domingo, 9 de outubro de 2011

Estado civil: Preguiçosa


     Parece um detector. Uma olhada em volta do ambiente, um reparo no salto ou na roupa da menina ali do canto, e nada de importante. Um cara atraente em meio a uma roda de amigos e “Hmm, que gracinha”. Os olhos captam e apitam as qualidades que nos agradam e os flertes começam. Olhares, sorrisos e enfim a aproximação. “Oi, tudo bem?” A partir daí, ninguém sabe até onde a conversa vai fluir. É instinto e não tem o que fazer. Sair com as amigas, rir e revezar assuntos sérios com todas as futilidades que temos em mente é bom sim, mas se surge no caminho uma possível companhia do sexo oposto, melhor ainda. Se o papo foi bom e os dois encontraram interesses em comum, provavelmente o encontro se estenderá e obviamente, o beijo vai acontecer.
     Passado o primeiro momento e o beijo dado, as coisas já não são mais como no princípio. O objetivo foi alcançado e o brinquedinho já não tem mais nenhuma surpresa. O que era fogo começa a esfriar e nessa fusão, a água prestes a virar gelo já é constante. Aquela história de que “figurinha repetida não completa álbum” ainda é o lema da vida de alguns cuecas que parecem fazer questão de retardar o próprio cérebro, tamanha babaquice que sustentam e que nós, mulheres, por vezes ainda nos deixamos levar mesmo sabendo até onde essa marmelada pode acabar. Sendo parte desse grupo feminino que já não deposita fé alguma em qualquer atitude surpreendentemente positiva provinda de qualquer barbado que seja, adentrei-me a um novo estado civil.
     Atualmente, se me perguntarem, respondo que estou preguiçosa. Isso mesmo, nem solteira, nem namorando e menos ainda casada. Essa instabilidade que hoje é tão fácil de se ver nos relacionamentos chega a me dar preguiça – de querer, de investir, ir atrás e se envolver, porque o resultado é sempre o mesmo: dedicação de mais e retribuição de menos. Educadas à moda antiga, necessitadas de palavras carinhosas e gestos cavalheiros que nos façam sentir requisitadas e queridas, criamos em nossas inocentes cabecinhas a imagem de um homem que, de fato, está em extinção. Não peço a ninguém que pague a minha conta ou então abra a porta do carro antes que eu entre ou saia do mesmo. Acho desnecessário. Mas homens, aqui vai uma dica: não folguem nessa gentileza feminina que poupa certos esforços da parte de vocês, para se apossar do comodismo que parece ter tomado conta da boa vontade de bem tratar as moçoilas. Palavras carinhosas – não digo melosas – elevam nosso ego e ainda fazem vocês ganharem alguns pontinhos com a gente, desde que ditas com verdade, é claro! Também são bons referenciais para se dar bem conosco a pontualidade, o compromisso com o que se diz e acima de qualquer coisa, a sinceridade. Muito mais me admira um cafajeste que logo de cara expõe o que verdadeiramente quer e pensa, do que o suposto bom moço que aos poucos mostra suas facetas nada condizentes com o que antes foi anunciado. Ah, e sem mais moralismos, por favor, porque o visual conta sim, e em certos casos acaba sendo determinante para uma primeira impressão, que (in)felizmente, meus caros, é a que fica. Portanto, capricho na apresentação, até porque não há como negar que a primeira atração é física, e que através de um simples beijo de cumprimentos, não somos capazes de adivinhar suas possíveis qualidades, concordam?!
     A falta de interesse em seduzir é grande e como o dito, a preguiça maior ainda. O que fazer? Jogar tudo ao alto e abstrair: as possibilidades fracassadas, os desapontamentos já ganhos, e também as súplicas por aquilo que após balancear os valores, nota-se que não vale a pena, porque existem mulheres demais para homens de menos. Menos caráter, menos educação, menos respeito e consequentemente, menos merecimento de estar ao lado de uma verdadeira amada – de carne, osso e curvas sim, mas também de cérebro, alma, potencial, capacidades às vezes surpreendentes e ainda, sentimentos. Não há muito que fazer e talvez nem seja preciso. O Universo conspira a favor, ainda que não no momento de maior necessidade. Paciência é a palavra chave para receber em troca todos os benefícios já sacrificados pela ansiedade de ter outros pés encostando os próprios em meio ao lençol bagunçado por inteiro na cama, essa espécie de cela que sela o casal. Deixe que floresça a vaidade, o bem estar consigo mesma. O amor próprio também sopra boas vibrações e acredite: ele é o único que nunca vai te trair.

sábado, 8 de outubro de 2011

Ao amor, a cicatriz


     Vem a chuva fina e fria, e com ela as lembranças. Boas ou ruins, são sempre companheiras inseparáveis das gotas que agora caem silenciosamente no chão, mas não na janela próxima a mim, e me fazem lembrar de outros momentos também cinzentos, entretanto, sem sinal algum da melancolia que hoje, aqui escrevendo, vivo enquanto retrato o que já se foi.
     Pelo aroma que ela traz, me aproximo de uma realidade já inexistente. Na falta dos outros quatro, o único sentido que me resta é sentir o cheiro similar àquela garoa que caía também nas venezianas do quarto no qual dormíamos. E era tão surreal que nunca me incomodava; pelo contrário, quando gotejava e a partir daí, começava a chegar com mais freqüência, eu apenas comemorava, pois assim tinha seus dedos por entre meus cabelos por mais tempo naquele ócio confortável de deitar e esperar o tempo passar sem ter que pensar em mais nada, senão na possibilidade de você sentir frio e eu então te abraçar para que isso logo pudesse passar.
     Quando não queríamos nos esconder, era embaixo dela mesma que eu mostrava toda a felicidade que vivia provisoriamente. Os beijos que te dava e com tanta simetria recebia de volta, independente do que houvesse por trás dessa troca (aparentemente) afetiva, eram ainda melhores quando acompanhados da pureza da água que naquele momento lavava qualquer má sorte moradora do meu corpo e também da mente. Abraçada a você, nosso calor era mais forte do que os ventos que tentavam me amedrontar. Prova disso era sempre que trovejava e as luzes se apagavam. Você se mostrava ali, presente e apto a me proteger e me mostrar que tudo estava bem quando notava meu susto sinalizado por um apertão no seu braço, ou então por um leve e breve pulo daqueles que só nossos reflexos sempre ativos sabem como agir. Era exatamente nesse tipo de atitude que se vista por cima, parece tão insignificante, que eu logo percebia que não estava só: você me abraçava no mesmo instante em que eu queria me mostrar resistente.
     E quando a chuva cessava dando lugar aos raios do sol ainda tímidos após a dominância das infindáveis gotículas, nós também estávamos ali. Você com os meus óculos de sol, não me fez pensar como seriam os dias após o fim dessa temporada de aventuras que eu jamais imaginara viver em um futuro tão próximo para a época. Não sem aquele olhar sério e quase fechado que fazia franzir a testa; típico de quem se incomoda com a claridade assim que acorda, para depois, acostumado com a idéia de viver o dia, lançar o mesmo sorriso matinal que é só seu e por certo tempo me acordou mais feliz.
     Com essa rotina mais do que graciosa para quem nunca tinha vivido com alguém de maneira tão intrínseca, eu me acostumei, e ainda hoje, depois de tantas mudanças e reviravoltas nessa história que um dia já foi tão terna, comigo ela ainda convive. Assim como a chuva que por quase todos os dias se mostrou presente em nossos momentos, e também agora enquanto os relato, tudo já passou. Foi-se com ela cada gota caída do céu e que hoje são minhas lágrimas.
     Choro sim e também lamento a falta de conexão entre tudo que poderia ter nos unido, mas pelo contrário, acabou nos afastando de tal forma que eu (não) aceito viver. No final das contas não deu, não era para ser comigo, e eu também não sei como seria caso tudo tivesse acontecido diferente. Declarações públicas de amor e delicadeza aliada ao pudor em certos assuntos, realmente não são e nunca foram com a nossa cara. A liberdade que sempre tivemos em nos envolver com outras pessoas já que nunca fomos ‘oficiais’, não encaixaria em um novo tipo de relacionamento mais restrito e de certa forma até mais respeitoso que nos déssemos.
     Acredito, então, que a solução seja deixar: o tempo passar e a vida acontecer. Cada um no seu canto, no seu ritmo e com as prioridades julgadas relevantes tanto na forma de pensar quanto na de sentir. Por mais clichê que pareça, aquele papo de “o que tiver que ser, será” é a maneira mais correta de se enxergar as peças que o destino nos prega. Afinal, se não fosse assim, dificilmente teríamos passado por tudo que já passamos. Conversas, beijos, sorrisos, pedidos de desculpas, arrepios, toques, olhares e tantas outras intenções subentendidas sempre ocasionais, mas por mim, também emocionais. Tudo foi embora e num paradoxo também ficou. Dessa marca, não tenho como me livrar e se é assim, hoje, cicatrizo-te.